4.24.2011

Cemitério de bonecas

O sol se põe na cidade de túmulos e os fantasmas acordam com a lua. Ela sente o vento encerrar paredes à sua volta, retendo o eco da morte que vibra entre o farfalhar das folhas secas e o uivo distante dos lobos  sedentos por sua carne.

Ela é boneca de porcelana presa na prateleira mais alta de uma estante. Uma boneca de porcelana com um coração que só serve para sangrar, mas que jamais experimentou qualquer uma dessas sensações arrebatadoras de amor e paixão que os livros contam e as canções cantam. É boneca de porcelana covarde, que se submete à humilhação de ser brinquedo de alguém quando pode simplesmente atirar-se da estante para o chão.

Não imaginam os lobos – esse lobos sedentos por sua carne – que ela é feita de vidro amolado e amargo, e que devorá-la no mínimo lhes esfolaria os lábios. Com seus olhos vítreos, ela observa – e observar é sua  sina – as lápides e as lápides lapidam seu olhar (como um pêndulo). Sente inveja dos mortos, cujas almas mesmo penadas vagam livremente entre os vivos; enquanto ela (boneca amaldiçoada) é voodoo que existe apenas para provocar sensações, mas nada sente.

Em algum lugar nesse mundo alguém deve sofrer sua dor e sentir os pregos que criavam seu espírito, porquanto ela – há muito –  tem a sensibilidade de um leproso.

Um comentário:

Uriálisson disse...

sei lá o que comentar,apenas gostei do texto,rs